O próximo presidente da República terá pela frente uma série de decisões importantes que deverão ser tomadas na área econômica nos primeiros meses depois de assumir o Palácio do Planalto, ou ainda durante o período de transição. São questões com impacto direto nas contas públicas, que estão no vermelho desde 2015, e que podem mexer também no bolso dos consumidores.

No dia 31 de dezembro, acabará o subsídio dado pelo governo Michel Temer ao óleo diesel. Sem recursos públicos que ajudem a bancar a redução no valor do produto, o preço do litro deverá subir R$ 0,30 na virada do ano. Calculado em R$ 9,5 bilhões em 2018, o subsídio foi aprovado para acabar com a greve dos caminhoneiros, que paralisou o País em maio. Não há, no entanto, previsão orçamentária para continuar com a política no próximo ano. Caberá ao presidente eleito decidir a renovação ou não do subsídio.

“Grupos de pressão vão lutar por mais recursos públicos, o que pode gerar greves e paralisações. Se não houver uma renovação do subsídio para o diesel, por exemplo, será que isso não gera uma nova paralisação”, questiona Vilma Pinto, pesquisadora do Ibre/FGV.

Para a especialista, a situação das contas públicas é a questão mais preocupante. O novo governo terá de conseguir autorização do Congresso, até março, para aumentar o endividamento público e conseguir pagar as aposentadorias. O Orçamento de 2019 só tem recursos para arcar com cerca de dois terços das despesas com os benefícios previdenciários. Para quitar tudo o que está programado, o novo presidente precisará de uma autorização do Legislativo.

Sem esse aval, o presidente eleito terá que interromper o pagamento de aposentadorias para não descumprir um dos atuais pilares do equilíbrio das contas públicas, a regra de ouro. De acordo com ela, a União não pode se endividar para pagar as contas do dia a dia. No entanto, o Brasil não tem mais recursos para bancar essas despesas sem pegar novos empréstimos ou emitir títulos. Assim, o próximo presidente terá de pedir autorização para lançar dívidas de R$ 258,2 bilhões para pagar essa conta.

O presidente eleito também terá que encontrar uma solução para uma nova despesa deixada pelo atual Congresso. Será preciso regulamentar rapidamente uma emenda à Constituição, aprovada no ano passado, que obriga o governo a abrir uma linha de crédito para financiar, com subsídios, o pagamento de precatórios por estados e municípios. Precatórios são dívidas que a Justiça, em sentenças transitadas em julgado, determinou que sejam pagas pelos governos. O estoque dessas dívidas é de cerca de R$ 100 bilhões. O custo da linha de crédito será menor que o custo de captação do governo federal, que bancará parte da conta dos precatórios estaduais e municipais.

“O presidente que assumir em janeiro tem uma agenda muito difícil pela frente. Ele não vai ter tempo de fazer discurso fácil. A campanha teve uma série de propostas populistas, mas a realidade é muito dura e precisará ser enfrentada, querendo ou não”, disse Ana Carla Abrão, sócia da consultoria Oliver Wyman. “Não é uma agenda fácil, vai requerer capacidade de negociar com o Congresso e dialogar com a sociedade”, acrescentou a economista.

Lei Kandir, concessões e salário-mínimo estão na lista

O governo também precisará dar uma solução rápida para as alterações na Lei Kandir. Anualmente, o governo transfere cerca de R$ 3,9 bilhões para os estados para compensar perdas decorrentes de desonerações tributárias dadas a empresas como incentivo às exportações. Porém, não há uma lei que regule essas transferências. O STF mandou o Congresso definir os parâmetros.

O problema é que o projeto em discussão no Congresso geraria despesa de R$ 39 bilhões todos os anos, 10 vezes maior que os atuais desembolsos. A equipe econômica atual avisou que não tem como suportar essa conta. Caberá aos novos integrantes do Palácio do Planalto negociar com governadores, Tribunal de Contas da União (TCU) e Congresso para encontrar uma saída.

“A Lei Kandir já deveria ter sido resolvida. Tem um prazo, que já passou, porque o governo Temer não fez nada. Essa é uma decisão que vai ser tomada no plano político pelo próximo presidente. Na hora em que ele assumir, no dia seguinte, vai ter uma fila de governadores atrás pedindo esse dinheiro”, comentou o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. Em outra frente, o governo Temer quer fazer, neste ano, três leilões de infraestrutura, incluindo 12 aeroportos, uma ferrovia e três terminais portuários. Se não conseguir, pretende deixar tudo encaminhado para os primeiros meses de 2019. Em qualquer hipótese, ficará nas mãos do próximo presidente o desfecho desse processo. Caso o governo atual consiga sucesso nas licitações, não haverá tempo hábil para assinar os contratos. Com isso, o próximo ocupante do Planalto decidirá se entregará os serviços à iniciativa privada.

Está em aberto, também, a política de reajuste do salário-mínimo a ser aplicada a partir de 2020. Atualmente, ele é calculado pela soma da variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do ano anterior e o resultado do PIB de dois anos anteriores. O objetivo é proporcionar ganhos reais – acima da inflação – aos assalariados, mas somente se o PIB tiver crescimento. Além disso, por determinação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo terá que elaborar, até março, estudo para reduzir subsídios e desonerações tributárias.

Previdência e Eletrobras são questões cruciais para o novo mandatário

Nos três primeiros anos de mandato, o próximo presidente terá pela frente um rombo de R$ 319 bilhões nas contas do governo, segundo as projeções do Orçamento de 2019. Apenas no ano que vem, as contas públicas ficarão no vermelho em R$ 139 bilhões. O principal responsável por esse resultado é a Previdência Social, cuja reforma é vista como urgente pelos especialistas.

A previsão é que as contas da Previdência registrem rombo total de R$ 308 bilhões em 2019, dos quais R$ 218 bilhões são do Regime Geral (INSS) e o restante, do Regime Próprio (servidores federais). As mudanças nas regras dos benefícios previdenciários estão na pauta desde 2016, quando o governo Michel Temer enviou para o Congresso uma proposta de reforma.

O projeto está parado desde fevereiro, quando foi decretada a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro – o que impede mudanças na Constituição. Agora, Temer ensaia votar a proposta depois do segundo turno, se tiver apoio do presidente eleito.

Também estará na pauta do novo governo a privatização da Eletrobras. A arrecadação de R$ 12 bilhões prevista com a venda da maior empresa de energia da América Latina está, inclusive, prevista no Orçamento do próximo ano. Com isso, se o processo não avançar, será preciso cortar despesas ou elevar as receitas no mesmo montante.

 

Fonte: Jornal do Comércio